Conheça artistas que encaram o desafio de substituir estrelas de musicais
Para ver de perto os atores do musical “Mudança de Hábito”, em São Paulo, principalmente a protagonista Deloris Van Cartier, vivida pela atriz e cantora Karin Hils (ex-Rouge), muita gente paga até R$ 260 por uma cadeira na plateia premium aos finais de semana. Mas, na sexta-feira do dia 10 de abril, a atriz principal teve uma gripe e precisou ser substituída nas cinco apresentações seguintes, o que demandou a escalação da “segunda goleira”, a mineira Josi Lopes, 27 anos. “Quando teve o áudio avisando [a troca], no sábado (11), o público fez: ‘Aaaaaaaaaaah’. Aí pensei: ‘Ih, rapaz, e agora?’ Mas fiz com todo o amor e, no final do segundo ato, todo mundo bateu palma e saiu falando bem”, lembra a cover (nome técnico dos substitutos) de Karin.
Josi diz que entende a reação dos espectadores, pois ela mesma já passou por isso, no lugar da audiência: “Fui assistir ao musical da Elis querendo ver a Laila [Garin, atriz baiana que atualmente está na novela ‘Babilônia’] e, quando cheguei lá, era a outra moça [a paulistana Lílian Menezes]. Fiquei decepcionada, mas, no decorrer da peça, ela foi me ganhando pela história, pelo todo, e não me arrependi. Saí feliz e satisfeita”, revela.
Lílian fazia as sessões vespertinas nos dias em que “Elis, a Musical” tinha duas apresentações seguidas, entre o fim de 2013 e o início de 2015, e também assumiu o papel da protagonista quando Laila se ausentou por um mês e meio, em 2014, por conta de um problema de saúde que prejudicou sua voz. “Esse ‘Uuuuuuuh’ e os murmúrios do público nunca me incomodaram. Se eu fosse ao teatro para ver alguém e soubesse na hora que quem iria fazer era outra pessoa, possivelmente também ficaria com um pé atrás”, afirma Lílian, 37 anos.
Danilo de Moura
A galera reclamava muito [da ausência de Abravanel], falava alto: 'Paguei a maior grana', não para me atingir, claro. Uma vez minha sogra quase discutiu com um cara da plateia que disse: 'Quem é esse bosta aí?'
Apesar disso, segundo ela, no intervalo entre os atos, o discurso da plateia já mudava completamente. “As pessoas falavam nos banheiros: ‘Se essa é a substituta, imagina a protagonista! Ela é surpreendente’”, recorda. Ao longo das várias apresentações, sobretudo no período em que a atriz e cantora paulistana – que cortou os cabelos para viver Elis, enquanto Laila usava peruca – comandou o espetáculo sozinha, Lílian foi formando um público cativo, só seu. “Muitos eram meus fãs, outros da Laila, do musical, da Elis, tinha de tudo”, destaca a artista, que nas segundas sessões de cada dia ainda integrava o elenco feminino de apoio, no qual fazia o coro e coreografias.
“Não existia a preocupação em cantar igual à Elis, mas em entender qual era a forma dela, para tentar se aproximar. Não cantar de forma idêntica. A voz da Laila é bem diferente da minha, ela tem uma grande potência, já eu tenho mais brilho. E as pessoas diziam ‘Nossa, ouvi a Elis cantar!' Essa é mágica do teatro”, avalia Lílian, que diz ser prima em quinto grau do neto de Elis, Arthur Bôscoli --seu pai é primo do pai da apresentadora Eliana, que teve um filho com João Marcelo Bôscoli, filho de Elis. Apesar do parentesco, eles não mantêm contato.
Principal-cover-principal
Às vezes, o artista principal vira cover – como foi o caso da atriz Josi Lopes, que viveu a leoa Nala, no musical “O Rei Leão”, e agora sente na pele o que sua substituta passava. Em outros casos, o cover também se torna protagonista. Foi assim com o ator e cantor paulistano Danilo de Moura, 32 anos, que assumiu o lugar de Tiago Abravanel no fim de 2012, quando o neto de Silvio Santos saiu de “Tim Maia – Vale Tudo, o Musical” para interpretar o turco Demir na novela “Salve Jorge”, de Glória Perez.
“Foi meu primeiro grande musical como personagem principal. Assumi um ano depois que o Tiago já estava em cartaz, precisei engordar 30 kg. E a galera reclamava muito [da ausência de Abravanel], falava alto: ‘Paguei a maior grana’, não para me atingir, claro. Uma vez minha sogra quase discutiu com um cara da plateia que disse: ‘Quem é esse bosta aí?’”, lembra, aos risos.
Mas Danilo se mostrou confiante com seu trabalho e costumava dizer para si: “Calma, relaxa, me deem duas cenas para eu mostrar o que sei fazer”. “Eu só pensava que tinha que arrebentar, não em ficar famoso. Mas tinha que dar o meu melhor, porque já começava com -10, senão nego ia me crucificar”, analisa o ator, que já conhecia bem o repertório de Tim Maia, mas passou a ouvi-lo 24 horas e descobriu coisas novas. “Passado o susto, veio a parte boa, um trabalho que me deu uma grande projeção”, ressalta o ator, que ficou em cartaz por mais de um ano, em São Paulo e no Rio, e ainda excursionou pelo país.
Letícia
Estou bastante ansiosa, são mais de 1.500 pessoas te olhando, é uma pressão muito louca. Mas não torço para ninguém ficar doente, não. Já substituí a Karin em alguns ensaios, quando ela foi para Nova York conhecer a Whoopi Goldberg
Mesmo depois de meses no lugar de Abravanel, Danilo ainda era confundido com ele. “Uma vez, uma mina em Belém falou: ‘Eu sabia que você ia ser assim, é lindo, perfeito, você canta, atua, mudou a minha vida, muito obrigada! Ah, e eu adoro o Silvio Santos!' Eu respondi: ‘O meu avô também’. Não sei se ela entendeu, só me abraçou, me beijou”, lembra o ator, que já morou com Abravanel no Rio, em 2009, quando os dois fizeram juntos o musical "Hairspray".
Para ganhar tanto peso, Danilo teve de pisar no acelerador e abandonar totalmente o controle da alimentação. “Comi freneticamente, era lasanha, cerveja, McDonald's, prato de arroz e feijão antes de dormir, parei de fazer exercícios. Antes estava todo fitness, com 90 kg, e cheguei aos 120 kg, em 1,75 m de altura", conta o ator, que já perdeu peso e hoje está com 107 kg. Além de musicais, que Danilo faz há dez anos, ele trabalha com música desde os 17 – canta na banda de soul Cia 1111, além de atuar na gravadora Casa 11 Records – e atualmente tem feito série de TV e cinema (gravou o longa “Fica Mais Escuro Antes de Amanhecer", do roteirista e diretor Thiago Luciano, que ainda não estreou; e neste mês começa a rodar a comédia “É Carnaval”, de Paulo Fontenelle).
O artista paulistano, que certa vez torceu o pé na coxia logo antes de uma apresentação de "Tim Maia" e não tinha ninguém para entrar em seu lugar, também critica o modo como os brasileiros ainda encaram o teatro. “A gente tem uma cultura no Brasil de só ver o que está bombando, o neto do Silvio Santos, o cara da novela. É normal pensar que, entre ver o Tiago Abravanel e um cara que eu não conheço, claro que vou escolher o Tiago. Mas uma hora isso vai mudar, espero que a galera vá pela peça, não só pelo elenco. Ator famoso dá bilheteria, mas tem tanta gente tão boa, tão preparada”, diz Danilo. E compara: “Na Broadway, é normal cada personagem ter três, quatro covers. Se o primeiro pega uma faringite, já não vai”.
Cover da cover
No caso do “Mudança de Hábito”, existe ainda uma “terceira goleira”, a atriz fluminense Letícia Soares, 32 anos, que ainda não estreou oficialmente na pele da protagonista Deloris Van Cartier, mas já sabe de cor todas as falas e marcações da personagem. “Estou bastante ansiosa, são mais de 1.500 pessoas te olhando, é uma pressão muito louca. Mas não torço para ninguém ficar doente, não. Já substituí a Karin em alguns ensaios, quando ela foi para Nova York conhecer a Whoopi Goldberg. E já foi bem assim: 'Uou', pois ela canta e fica no palco em 90% do tempo”, afirma Letícia, cujo estresse nos últimos meses também aumentou por conta de seu casamento, marcado para esta terça-feira (21) em sua cidade natal, Magé (RJ).
Além de ter a função de cover da protagonista, a atriz e a colega Josi Lopes assumem outras funções na peça. Josi faz parte do coro de freiras e ainda interpreta uma amiga de Deloris, chamada Michelle. Letícia, por sua vez, também integra o coro e está apta a interpretar Michelle quando Josi virar Deloris ou estiver ocupada fazendo “tracking” – seguir cada passo de Karin nas apresentações (a partir da coxia ou da plateia), como forma de preparação.
Aliás, todos os personagens do musical têm seus substitutos, e duas das atrizes – Giovanna Moreira e Raquel Paulin – ainda funcionam como “swing”, ou seja, são capazes de cobrir qualquer personagem feminino de “Mudança de Hábito”, com exceção da protagonista, que é negra (as duas são brancas). Isso significa que elas precisam ter na ponta da língua todos os diálogos, canções e coreografias do musical, que tem duas horas de duração. Letícia mesmo já atuou como "swing", mas em “O Rei Leão”.
Josi Lopes
Quando teve o áudio avisando [a troca], o público fez: 'Aaaaaaaaaaah'. Aí pensei: 'Ih, rapaz, e agora?' Mas fiz com todo o amor e, no final do segundo ato, todo o mundo bateu palma e saiu falando bem
“As pessoas podem até fazer ‘ah!’ no começo, porque foram para ver a Karin, mas no final o ‘ah!’ é de admiração, ninguém fica devendo, e cada uma faz a sua própria Deloris. Esse, aliás, foi um pedido da própria Whoopi, de ninguém imitar ninguém. E isso até seria impossível, porque somos três mulheres diferentes fisicamente – eu sou mais baixa e tenho bundão, a Josi é alta e magra, a Karin é mais malhada – e também vocalmente”, diz Letícia. Segundo ela, desde o primeiro ensaio, a diretora Fernanda Chamma já deixou claro que não queria duas cópias de Karin Hils, mas três Deloris, com suas marcas próprias e jeitos de falar (Karin é carioca, Josi é mineira, e Letícia, do interior do Rio).
O desafio delas, porém, é manter sempre o padrão de qualidade da Broadway. "O nosso elenco á praticamente todo de covers. E a qualidade não muda, independentemente da pessoa que estiver fazendo. A gente está trabalhando para entregar uma coisa bem feita, com harmonia", afirma Josi. Inspirada numa frase que ouviu certa vez, Letícia completa: "Espero que a plateia se apaixone pela gente, seja na primeira cena ou só no final, mas em algum momento a nossa arte vai tocar o público".
Formada em assistência social, a atriz fluminense teve uma guinada na carreira em “O Rei Leão”, após ter sido aprovada em seu quarto teste de elenco para o musical. Além disso, ela se dedica à música, em estilos como choro, samba e jazz. A colega Josi Lopes também canta, e planeja para junho o lançamento de seu primeiro EP, "Espelho", com quatro canções. Sua praia são os estilos MPB, música contemporânea e afropop. E, em cena, ela tem cantado cada vez mais: “A Nala entrava no segundo ato e tinha apenas dois solos. Agora são 11 músicas, aumentou muito a minha disponibilidade de palco e voz”, compara.
As duas covers de Karin ainda ensaiam em casa, estudam bastante o texto e as movimentações. Tanta dedicação e tensão com a estreia no papel principal deixaram Josi “só o pó” após as cinco apresentações, na segunda-feira, 13 de abril. “Quando relaxei, vi o tanto que o meu corpo estava dolorido”, conta. Mas valeu a pena, segundo a atriz escreveu em sua conta no Instagram, no dia 10: “Ainda estou em êxtase!!!! Foi um dia de muitas emoções. Este mês todo, inclusive. GRATIDÃO!!! (…) Substituir Karin Hills em um espetáculo nunca passou por minha cabeça, fazer a Whoopi Golberg, menos ainda... Tô feliz!!!! Muita responsa”.
Além disso, Josi ressalta a importância dos protagonistas negros em musicais. "A gente sabe da responsabilidade que é, mais ainda aqui no Brasil. Isso já começou com 'O Rei Leão', que tinha todo o elenco negro, com bons profissionais", destaca.
Serviço:
Musical "Mudança de Hábito"
Quando: Quintas e sextas, às 21h, sábados, às 17h e 21h, e domingos, às 16h e 20h
Onde: Teatro Renault (Av. Brigadeiro Luís Antônio, 411 – Bela Vista, São Paulo)
Quanto: De R$ 25 (meia) a R$ 260 (inteira)
Quintas, às 21h
Plateia Premium: R$ 240 (inteira) e R$ 120 (meia)
Camarote: R$ 200 (inteira) e R$ 100 (meia)
Visão Parcial Balcão B: R$ 50 (inteira) e R$ 25 (meia)
Camarote / ZZ: R$ 200 (inteira) e R$ 100 (meia)
Plateia A: R$ 200 (inteira) e R$ 100 (meia)
Plateia B: R$ 170 (inteira) e R$ 85 (meia)
Balcão A: R$ 100 (inteira) e R$ 50 (meia)
Balcão B: R$ 50 (inteira) e R$ 25 (meia)
Sextas às 21h / Sábados às 17h e 21h / Domingos às 16h e 20h
Setor Premium: R$ 260 (inteira) e R$ 130 (meia)
Camarote: 220 (inteira) e R$ 110 (meia)
Visão Parcial Balcão B: R$ 50 (inteira) e R$ 25 (meia)
Camarote / ZZ: R$ 220 (inteira) e R$ 110 (meia)
Plateia A: R$ 220 (inteira) e R$ 110 (meia)
Plateia B: R$ 190 (inteira) e R$ 95 (meia)
Balcão A: R$ 110 (inteira) e R$ 55 (meia)
Balcão B: R$ 50 (inteira) e R$ 25 (meia)
Pontos de venda:
- Bilheteria oficial (sem taxa): Diariamente, 12h às 20h (em dias de espetáculo, a bilheteria funciona até o início da apresentação)
- Internet: www.ticketsforfun.com.br
- Call-center: 4003 5588
Pontos de venda neste link
Capacidade: 1.530 lugares
Assentos: O teatro conta com 16 assentos para deficientes físicos e 11 para pessoas obesas
Classificação etária indicativa: Livre. Menores de 12 anos: permitida a entrada (acompanhados dos pais ou responsáveis legais)
Estacionamento: O teatro não possui estacionamento próprio
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