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Após cair em domínio público, "O Pequeno Príncipe" ganha novas edições

Rodrigo Casarin

Do UOL, em São Paulo

21/01/2015 07h00

Mesmo quem nunca leu “O Pequeno Príncipe” já se deparou por aí com frases presentes no livro, como “tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas” ou “o essencial é invisível para os olhos”, além de desenhos dos personagens da obra. E, em 2015, com certeza encontrará muito mais referências ao romance do francês Antoine de Saint-Exupéry, principalmente nas livrarias.

Isso porque no ano passado se completaram sete décadas da morte do autor, e toda a sua produção passou a ser de domínio público a partir de 1º de janeiro de 2015. Com isso, editoras nacionais já se movimentam para colocar no mercado as suas versões para um dos maiores clássicos da literatura mundial, que, desde o lançamento, em 1943, permanece em listas de mais vendidos –só no Brasil, já teve mais de 2 milhões de exemplares comercializados— e já foi lançado em mais de 250 idiomas, tornando-se o título mais traduzido a partir da língua francesa.

“O Pequeno Príncipe” apresenta a história de um piloto de avião que, após uma pane em sua aeronave, é acordado por um garoto loiro em pleno deserto do Saara. O menino o conduz por uma narrativa que desafia os conceitos da realidade, ao mesmo tempo em que questiona diversos valores de nosso mundo. O texto da versão original da obra era acompanhado por ilustrações em aquarela feitas pelo próprio Exupéry, desenhos que agora também estão livres para ser usados em novas versões do livro.

As versões que virão

Das editoras nacionais que trabalharão com “O Pequeno Príncipe” em 2015, a L&PM e a Geração Editorial saíram na frente. Suas edições já estão prontas e seguem proposta semelhante, com dois formatos distintos e apêndices com material extra sobre o autor, cuja vida e o restante da obra são bem menos conhecidos do que seu livro mais famoso.

“Trata-se de um clássico popular com conceitos universais, que jamais perderão o sentido. Tendo caído em domínio público, é natural que várias editoras se interessem por fazer suas próprias edições”, diz Fernanda Emediato, diretora-executiva da Geração Editorial, que apostou numa tradução de Frei Beto e em uma opção com capa dura, para colecionadores, e outra de bolso, com preço mais em conta.

A L&PM também traz uma versão de bolso –marca da editora– acompanhada de outra tradicional, como costuma fazer com seus principais títulos. “[Resolvemos editar 'O Pequeno Príncipe'] porque é um ícone moderno, um livro cuja perenidade é incontestável”, explica Ivan Pinheiro Machado, editor da casa.

A tradução ficou por conta de Ivone Benedetti e, segundo os editores, traz uma diferença significativa se comparada às versões que tínhamos da obra no país. No capítulo 17, por exemplo, quando a personagem Rosa fala sobre os humanos, uma das frases era: “Os homens? Eu creio que existem seis ou sete. Vi-os faz muito tempo. Mas não se pode nunca saber onde se encontram. O vento os leva. Eles não têm raízes. Eles não gostam das raízes”.

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    Trata-se de um clássico popular com conceitos universais, que jamais perderão o sentido. Tendo caído em domínio público, é natural que várias editoras se interessem por fazer suas próprias edições

    Fernanda Emediato, diretora-executiva da Geração Editorial

Já na versão de Ivone, devido a uma diferença na interpretação do francês, a fala da Rosa passou a ser: “Humanos? Existem uns seis ou sete, acho. Eu os avistei há alguns anos. Mas nunca se sabe onde podem ser encontrados. São carregados pelo vento. Não têm raízes, esse é o problema deles”.

A primeira versão citada no texto é a de Dom Marcos Barbosa, publicada pela Agir, detentora exclusiva dos direitos da obra no país de 1952 até o final de 2014. No início do ano passado, aliás, a editora colocou no mercado uma nova tradução de “O Pequeno Príncipe”, assinada por Ferreira Gullar, que já apresentou outra versão da fala da Rosa, muito mais próxima da de Ivone: “As pessoas? Creio que só existem umas seis ou sete. Eu as vi faz alguns anos. Mas não se sabe nunca onde elas se encontram. O vento as leva. Elas não têm raízes, o que é um problema”. Por meio de sua assessoria de imprensa, a Agir garantiu que não pretende fazer qualquer tipo de reparo em suas edições, respeitando as decisões tomadas por Barbosa e Gullar.

Além da Geração Editorial e da L&PM, outras três grandes editoras deverão lançar “O Pequeno Príncipe” ao longo de 2015. Uma delas é a Autêntica, que publicará a obra com tradução de Gabriel Perissé em seu selo infantil. Em outubro, também chegará ao Brasil o filme de animação "O Pequeno Príncipe", adaptação do livro com direção de Mark Osbourne, com vozes dos atores James Franco, Rachel McAdams e Marion Cotillard (veja o trailer abaixo).

Sobre o domínio público

A Lei do Direito Autoral prevê que qualquer tipo de obra resultante de um trabalho intelectual passe a ser de domínio público depois de setenta anos contados a partir de 1º de janeiro do ano seguinte à morte do autor. Como Exupéry morreu em 1944, a contagem de tempo para sua obra cair em domínio público começou então em 1º de janeiro de 1945, por exemplo.

Dinovan

  • A partir do momento em que a obra passa a ser de domínio público, qualquer pessoa pode, independentemente de autorização ou pagamento de qualquer valor, copiá-la, distribuí-la, explorá-la economicamente, modificá-la... De toda forma, sempre deverá informar a autoria, dar o crédito

    Dinovan Oliveira, membro da Comissão de Direito às Artes da OAB - SP

“A partir do momento em que a obra passa a ser de domínio público, qualquer pessoa pode, independentemente de autorização ou pagamento de qualquer valor, copiá-la, distribuí-la, explorá-la economicamente, modificá-la... De toda forma, sempre deverá informar a autoria, dar o crédito”, explica Dinovan Oliveira, membro da Comissão de Direito às Artes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo.

No caso específico de Exupéry, tanto o Brasil quanto a França seguem essa lei. “Pelo que tenho conhecimento, são poucos os países que dispõem de forma diferente. Geralmente, o que varia é o prazo de proteção. Um bom exemplo é o México, onde, salvo melhor juízo, o prazo vigora durante toda a vida do autor, acrescendo, após a sua morte, outros cem anos de proteção”, diz Oliveira. O advogado também pondera que determinadas vertentes da arte podem seguir regras específicas, como é o caso da fotografia, cujo prazo para que a obra caia em domínio público passa a contar a partir do momento que a imagem é publicada, não quando o seu autor morre.

Há um porém, no entanto, com relação ao espólio de Exupéry: seus descendentes transformaram os personagens do livro em marca registrada para, com isso, garantir as receitas provenientes de merchandising e de outros produtos ilustrados com os desenhos do autor. Assim sendo, o livro pode ser publicado integralmente, como em sua versão original ilustrada. Os desenhos do livro, contudo, não podem ser utilizados, por exemplo, em camisetas, agendas ou qualquer outro tipo de objeto sem que haja uma autorização prévia.