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"Biografo é um ser em risco de extinção", afirma Mário Magalhães

O jornalista Mário Magalhães - Divulgação
O jornalista Mário Magalhães Imagem: Divulgação

Carlos Minuano

Do UOL, em Fortaleza (CE)

17/11/2013 07h33

“O Festival Internacional de Biografias foi pensado para discutir a carpintaria biográfica”, afirma o jornalista Mário Magalhães, curador da mostra literária da primeira edição do evento, blogueiro do UOL e autor do livro “Marighella”, que ganhou o prêmio Jabuti de Melhor Biografia, e que, segundo Magalhães, chega a sua quinta reimpressão no fim desse mês.

O jornalista tem feito o que pode para destacar o tema central do festival: “Histórias de vida”. Apesar da recente controvérsia sobre biografias não autorizadas impor-se em todos os debates do evento que reuniu os principais biógrafos do país. “Estou aprendendo muito com eles, quem está falando aqui é a nata dos biógrafos brasileiros, além de jornalistas altamente qualificados em vias de estrear nesse gênero”, afirmou ao UOL. Veja a seguir trechos da entrevista.

UOL – Como você veio parar na curadoria desse festival?
Mário Magalhaes – Por conta da biografia “Marighella” e da boa vontade com que ela foi recebida pela crítica e pelo público, eu fui convidado a fazer a curadoria literária do evento, e convidei onze biógrafos jornalistas consagrados e mais biógrafos em vias de estrear no gênero.

Pode citar quais autores inspiram seu trabalho?
Pelé e Garrincha da biografia brasileira, que não deixam nada a dever para biógrafos de qualquer país, incluindo Reino Unido e Estados Unidos, estão aqui, são Fernando Morais e Ruy Castro. Mas sou leitor de todos os outros que estão aqui, eu os convidei por conta do trabalho deles, combinam duas qualidades difíceis de encontrar num só autor, capacidade espantosa de apurar informações e imenso talento para narrar histórias.

Qual a sua expectativa em relação à decisão do STF quanto às biografias não autorizadas?
Nos próximos dias 20 e 21 de novembro será realizado uma audiência pública convocada pela ministra Carmem Lúcia, relatora desta Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) para que ela se instrua sobre o tema e faça um relatório para os outros ministros do STF. Não há nenhuma sessão marcada no Supremo para decidir a questão. Ou seja, pode ser que a decisão seja rápida, mas pode ser também que demore. Torço e espero que o Superior Tribunal Federal elimine essa aberração autoritária que é a censura prévia, não só para as biografias, mas para conjunto da produção cultural e jornalística.

Além da Adin, existe um projeto de lei sobre esse tema, pode falar um pouco dele?
Tem um projeto de lei do deputado Nilton Lima (PT-SP), que muda a redação do artigo 20 do código civil permitindo a publicação de biografias não autorizadas por seus biografados ou herdeiros. Está tramitando, então a luta contra a censura tem hoje institucionalmente dois terrenos, o Supremo Tribunal Federal, com a Adin, e o Congresso com o projeto de lei.

Os debates mostraram um pouco de pessimismo, qual sua opinião sobre a situação atual de biógrafos?
Biógrafo é um ser em risco de extinção. Se for mantida e legislação vigente obscurantista, que proíbe relatos históricos independentes impondo censura prévia, vão se multiplicar os casos que estão ocorrendo e que são numerosos de biógrafos, jornalistas e historiadores, que estão abandonando projetos de biografias, temerosos de que biografados ou seus herdeiros impeçam a publicação de biografias independentes.

E o que você pensa sobre os argumentos do grupo Procure Saber, eles foram chamados ao debate?
Considero que defendem legislação antidemocrática arcaica que contribui de maneira nefasta para que povo brasileiro não conheça sua história. Esse evento foi marcado muito antes de eclodir essa discussão das biografias não autorizadas, para discutir a carpintaria biográfica, como e por que se faz, evidentemente, por conta do debate nacional em torno de biografia e de censura, esse tema é um dos focos do festival. Mas não estamos aqui para discutir o marco legal. Não consultei nenhum dos convidados sobre essa questão, desconheço, aliás, a opinião de alguns.

Aproveitando o gancho, fala um pouco da carpintaria do livro “Marighella”.
Identifico na biografia jornalística uma reportagem, que é um gênero do jornalismo, então considero que a metodologia da produção biográfica no fundo é a mesma dos métodos de uma reportagem. Então para fazer uma biografia, tem cinco passos bem reconhecíveis, que são os passos da reportagem: ideia, consolidação da pauta, apuração, redação e edição. Só que pela apuração colossal de uma biografia, o autor tem que ter muito mais rigor e disciplina se não se perde no amontoado de informações acumuladas.

E o livro está caminhando bem, já recebeu alguns prêmios, tem alguma novidade sobre ele?
“Marighella” recebeu prêmio de Melhor Biografia Jabuti 2013, da Associação de Críticos de Arte e do site botequim cultural. E até o fim desse mês chega às livrarias a quinta impressão do livro.