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Brasileira diz que exibir filme em Cannes é "um pouco assustador" e "incrível"

Cena do filme "Sem Seu Sangue", da diretora Alice Furtado - Divulgação
Cena do filme "Sem Seu Sangue", da diretora Alice Furtado Imagem: Divulgação

Carlos A. Moreno

Rio de Janeiro (Brasil)

12/05/2019 17h24

Com o filme de estreia selecionado para concorrer neste mês na Quinzena dos Realizadores, do Festival de Cannes, a diretora carioca Alice Furtado acha que ainda está crua para disputar esta seleção paralela, mas acredita que esta é a oportunidade da sua vida.

"Não sei o que pensar. Aconteceu e tem um lado um pouco assustador, porque às vezes me sinto muito crua para isso que está acontecendo, que é uma coisa enorme. Ao mesmo tempo, é incrível. É a melhor forma de começar", afirmou a cineasta, de 31 anos, em entrevista à Agência Efe no Rio de Janeiro.

"Sem Seu sangue" foi um dos 24 escolhidos para a 51ª edição da "Quinzaine des réalisateurs", que acontecerá entre 15 e 25 de maio. Ele concorrerá com filmes de diretores já conhecidos, como o filipino Lav Diaz, o francês Bertrand Bonello e o japonês Takashi Miike.

"Foi muito difícil me dar conta de tudo o que pode acontecer a partir de agora. Acho que a ficha ainda não caiu totalmente, mas é incrível", afirmou ela, que é formada em cinema pela Universidade Federal Fluminense e que até agora tinha apenas dois curtas-metragens no currículo.

"Crua", mas experiente

A diretora Alice Furtado - Reprodução/EFE - Reprodução/EFE
A diretora Alice Furtado
Imagem: Reprodução/EFE

Apesar de ser a brasileira mais jovem a ser selecionada para Cannes, Alice já tem experiência no festival. Seu primeiro curta, "Duelo Antes da Noite", produzido aos 22 anos, foi escolhido em 2010 para a mostra competitiva "Cinéfondation" (para diretores em formação).

"Era um ambiente mais acolhedor, onde cuidam dos produtores porque todos eram muito jovens, todos estavam passando por aquilo pela primeira vez, então é menos profissional. Agora, não sei o que esperar. Quero viver este momento com toda a equipe. Acho que vai ser super emocionante. Não tenho como ter uma dimensão porque é uma sala para 825 pessoas num local onde o cinema está em primeiro lugar", explicou.

A diretora, que em 2012 estudou no Le Fresnoy (um dos principais centros de formação artística e audiovisual da França), onde dirigiu "A Rã e Deus", melhor curta-metragem do Festival Pancevo 2014, admitiu que teme sentir calafrios de timidez, característica que deixou aparente na entrevista.

"Esse é meu primeiro longa-metragem, o primeiro de ficção da minha produtora, e para os coprodutores franceses também é um dos primeiros longas. Todos somos marinheiros de primeira viagem", ressaltou.

História introspectiva

"Sem seu sangue", uma coprodução de Brasil, França e Holanda, conta a história de uma adolescente introspectiva que se apaixona por um jovem hemofílico e problemático.

"A ideia é trazer essa coisa da intensidade do amor jovem e como o luto amoroso pode ser uma experiência devastadora. O desejo, quando vivido intensamente, pode trazer coisas extraordinárias", explicou.

Ela disse não saber como será a receptividade do público e revelou que costuma ouvir perguntas sobre a origem da história.

"Tenho muita dúvida sobre a receptividade, porque sempre que conto a história do filme todo mundo me diz que é uma coisa louca e me pergunta de onde surgiu. Realmente foi uma costura, coisas que fui pensando e unindo (...), é algo muito pessoal", afirmou.

Cena do filme "Sem Seu Sangue" - Reprodução - Reprodução
Cena do filme "Sem Seu Sangue"
Imagem: Reprodução

Cinema no Brasil e Bolsonaro

Para ela, a seleção de quatro filmes brasileiros para Cannes este ano ("Bacurau" e "O Traidor" disputarão na competição oficial e "A vida invisível de Eurídice Gusmão" estará em Un Certain Regard), reflete o bom momento do atual cinema autoral do país.

"Vivemos um período muito bom para o cinema independente, para os diretores estreantes. Tivemos uma linha da Ancine (Agência Nacional do Cinema) voltada a filmes com propostas de linguagem inovadora, de relevância artística. Isso teve muitos frutos interessantes, e ainda estamos vendo os resultados dessa política", disse.

No entanto, reconheceu que a extinção dessa linha de financiamento, feita pelo governo do presidente Jair Bolsonaro, ameaça não só o bom momento, mas toda a indústria do cinema nacional.

"Neste momento, estamos com muitas perguntas sem resposta. Não tenho como prever muito o futuro, mas temo que tenhamos perdido esse lugar do cinema autoral, das pessoas que estão estreando. Tenho realmente medo", concluiu.