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"Versos Satânicos" não seriam publicados hoje, afirma Rushdie

Salman Rushdie, autor de "Os Versos Satânicos" - AP Photo/The Canadian Presss, Chris Young
Salman Rushdie, autor de "Os Versos Satânicos" Imagem: AP Photo/The Canadian Presss, Chris Young

17/09/2012 09h01

Escritor, obrigado a viver escondido após livro ser considerado blasfemo com Islã, vê clima atual de 'medo e nervosismo'.

O livro "Os Versos Satânicos", que em 1989 provocou a ira de muçulmanos pelo mundo e levou o escritor Salman Rushdie a ter que viver escondido, não seria publicado hoje no atual clima de "medo e nervosismo", segundo avalia o autor.

"Um livro crítico ao Islã dificilmente seria publicado hoje", afirmou Rushdie em entrevista à BBC, em meio às manifestações antiamericanas no mundo islâmico deflagradas pela divulgação do vídeo "Innocence of Muslims", considerado difamador contra o profeta Maomé.

Para o escritor indiano-britânico de 65 anos, a única maneira de resolver a questão é com os editores assumindo uma postura mais corajosa. "A única maneira de viver em uma sociedade livre é sentir que você tem o direito de dizer e fazer coisas", diz Rushdie.

Muitos muçulmanos consideram "Os Versos Satânicos" blasfemos, e o livro ainda é proibido em diversos países, incluindo a Índia.

'Efeito assustador'
Rushdie afirma que a proibição de seu livro e as ameaças contra sua vida criaram um "efeito assustador de longo prazo".

Ele foi obrigado a viver vários anos escondido e sob proteção policial após o então líder supremo do Irã, aiatolá Khomeini, ter publicado uma fatwa (decreto religioso) pedindo a execução do escritor.

Rushdie afirma que a perseguição a escritores permanece um problema sério em vários países muçulmanos, incluindo Turquia, Egito, Argélia e Irã.

"Se você observar a maneira como a livre expressão está sendo atacada pelo extremismo religioso, as coisas pelas quais essas pessoas são acusadas são sempre as mesmas – é blasfêmia, heresia, injúria, ofensa – é um vocabulário medieval", afirma.

"Estamos em uma posição difícil, porque há muito medo e nervosismo por aí", diz.

Ele cita como exemplo o fato de que na semana passada o canal de TV britânico Channel 4 foi obrigado a cancelar a exibição de um documentário intitulado "Islam: The Untold Story" (Islã: a história não contada, em tradução livre) após sofrer ameaças.

"O fato de que um documentário sobre o Islã pode ter sua exibição cancelada porque alguém teme suas consequências é uma indicação disso (do clima de medo)", observa.

Otimismo
O autor observa, porém, que há alguns anos, no 20º aniversário da fatwa contra ele, muitas pessoas que haviam ajudado a organizar os protestos contra ele disseram aos jornais terem se arrependido de suas ações.

"Algumas pessoas pareciam aceitar o argumento da livre expressão e entendiam que se tinham o direito de dizer como se sentiam, era errado evitar que as pessoas que tinham sentimentos diferentes pudessem se expressar", diz.

"Se isso for correto, talvez possamos sair deste clima de medo", diz.

O escritor se prepara para lançar um livro de memórias intitulado "Joseph Anton" (o nome que escolheu - em referência aos seus autores preferidos, Joseph Conrad e Anton Chekhov - a pedido da polícia, no período em que viveu sob proteção), no qual conta como foi forçado a viver escondido após a fatwa de Khomeini em 1989.