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"Tradição e Ruptura" foi 1ª mostra de design brasileiro, diz Mindlin

Da Redação

TV UOL

O empresário e bibliófilo José Mindlin fala com a TV UOL

O empresário e bibliófilo José Mindlin fala com a TV UOL

O empresário e colecionador de livros José Mindlin, 92, foi presidente da Fundação Bienal, e, durante seu mandato, promoveu a exposição "Tradição e Ruptura", em 1984, a primeira a apresentar design brasileiro.

"Os esforços para o desenvolvimento de um design brasileiro ainda estavam numa fase de formação e ainda não se acreditava propriamente na capacidade do Brasil de criar um design próprio", contou em depoimento ao UOL o empresário, fundador da empresa Metal Leve de componentes para automóveis.

Mindlin, que desde de junho de 2006 ocupa a cadeira número 29 da Academia Brasileira de Letras, nasceu em São Paulo, filho de judeus russos imigrantes, e se formou em advocacia no Largo São Francisco (USP), profissão em que atuou por 15 anos.

Sua coleção de livros, a maior da América Latina, conta com mais de 30 mil volumes, muitos deles raros, como seu exemplar da primeira edição de "O Guarani", de José de Alencar, de 1857.

Leia a seguir a transcrição do depoimento de José Mindlin:


JOSÉ MINDLIN

1ª Bienal
A primeira lembrança foi a da primeira Bienal. Eu não assisti a abertura porque estava viajando, mas logo depois na volta eu ainda pude apreciar e foi uma Bienal que a gente não se esquece, porque tinham grandes nomes de arte européia, e foi uma invenção importante, sob a direção do Ciccilo Matarazzo, que se manteve na presidência, creio que durante algumas Bienais.

Um convite de Ciccilo
Uma vez, num encontro da Bienal, ele reclamou que nunca tinha sido convidado para jantar aqui em casa. E eu digo: quem sou para convidar Ciccilo Matarazzo para jantar em minha casa? e ele disse: Não, eu gostaria muito de ir. Então combinamos e ele veio aqui.
Na realidade, o que ele estava querendo _nós nos conhecíamos, mas meio superficialmente_ e eu acho que ele queria me conhecer melhor, ver como era o ambiente aqui em casa e tudo, porque depois do jantar ele me convidou para entrar para a diretoria da Bienal. E ficamos amigos com um relacionamento excelente e eu procurei dar a contribuição possível.

Tradição e Ruptura
Não me lembro em que circunstâncias eu fui eleito presidente da Bienal, depois, bem depois da saída do Ciccilo. Tive um trabalho conjunto com o João Marino que, se não me engano, era o vice-presidente, e o Luiz Villares.

Naquela altura, eu já achava que a Bienal devia ser remodelada, porque dentro do escopo inicial ela já tinha dado o que podia dar.
Eu achava que dois anos era um intervalo pequeno para trazer arte internacional que tinha muito de experimental e era muito parecida entre si.

E quando eu assumi a presidência eu propus à diretoria e ao conselho de alternar a chamada Bienal com uma exposição de arte brasileira, além de outras atividades de ensino e de divulgação de arte.
E fizemos uma exposição que se chamou de "Tradição e Ruptura". Uma parte de arte brasileira colonial e a parte acadêmica e a parte contemporânea.

Design brasileiro
Foi a primeira exposição em que o design brasileiro foi representado.
Surpreendeu muita gente, porque pôde ser apresentado naquela ocasião, quando os esforços para o desenvolvimento de um design brasileiro ainda estavam numa fase de formação e ainda não se acreditava propriamente na capacidade do Brasil de criar um design próprio.

Nós vínhamos trabalhando nisso _o Dílson Funaro, o Luiz Villares e eu, através da Federação das Indústrias_, procurando incentivar a formação de um design que fosse reconhecido universalmente como design brasileiro, uma marca brasileira, como ocorre com os países europeus, ou com o Japão. Um produto sueco ou um produto do japonês, ou italiano, é reconhecido pelo design, sem precisar maiores indagações.

Hoje, nós estamos progredindo bastante. Diante disso, a Bienal de Design, que se realizou há pouco, mostra que houve um grande progresso nesse campo.

Mas, a primeira vez que o design em matéria de móveis, de cristais e mesmo da parte tecnológica brasileira foi apresentado foi nessa "Tradição e Ruptura".

Conselho sem poder
Eu continuo a achar que devia ser encontrada uma fórmula de dar maior intervalo entre as exposições, porque isso realmente representaria de uma para a outra uma diferença muito mais marcante do que as últimas bienais que se realizaram.

Fiquei no conselho durante vários anos, mas depois me dei conta de que o conselho tinha um papel muito reduzido, quem dirigia a Bienal era a diretoria executiva, mas os membros do conselho tinham uma responsabilidade moral pelo que estava acontecendo, pelas decisões tomadas, muitas vezes sem o conselho ser ouvido e aí eu me desliguei, juntamente com o João Marino e o Luiz Villares e então de lá para cá tenho tido pouco contato.

Reconheço que houve várias bienais, todas elas representando um esforço considerável, que tiveram interesse de apresentar bonitas coisas, mas a um custo excessivo para um país como o nosso.